RESUMO
O Audemars Piguet Royal Oak Skeleton, referência BA4266, datado de 1985, não é apenas um instrumento de cronometragem; é um manifesto de resistência da Alta Relojoaria suíça. Em um período dominado pela precisão eletrônica e barata da 'Crise do Quartzo', a Audemars Piguet tomou a decisão audaciosa de expor a alma mecânica de seu relógio mais icônico. Posicionado no ápice do luxo horológico, este modelo foi direcionado a uma elite de colecionadores que valorizava a arte manual sobre a funcionalidade utilitária. Diferente do Royal Oak original de 1972, que chocou o mundo como um relógio esportivo de aço a preço de ouro, o BA4266 em ouro amarelo 18k elevou o conceito de 'sport-luxury' para 'art-luxury'. A filosofia de design aqui é o paradoxo: a caixa robusta e industrial desenhada por Gérald Genta abriga um movimento de delicadeza extrema, onde o metal supérfluo foi removido cirurgicamente para revelar a dança das engrenagens. É significativo na horologia por reafirmar a relevância do calibre mecânico ultraplano 2120, transformando o Royal Oak de um relógio esportivo robusto em uma vitrine de savoir-faire, provando que a mecânica tradicional possuía um valor estético insubstituível.
HISTÓRIA
A história do Audemars Piguet Royal Oak Skeleton BA4266 de 1985 é intrínseca à sobrevivência e ao renascimento da relojoaria mecânica de alto nível. Para compreender a magnitude deste lançamento, deve-se olhar para o cenário da época: meados da década de 1980, quando a indústria suíça ainda sangrava devido à dominação dos relógios a bateria. Enquanto muitas marcas tentavam competir baixando custos ou adotando o quartzo, a Audemars Piguet escolheu o caminho oposto: a exaltação da complexidade mecânica tradicional. A marca já possuía uma herança de relógios de bolso esqueletizados desde 1934, mas aplicar essa arte a um relógio de pulso esportivo — e especificamente ao calibre 2120 — foi um feito técnico monumental. O calibre 2120, lançado originalmente em 1967 (desenvolvido com a Jaeger-LeCoultre e utilizado também pela Patek Philippe e Vacheron Constantin), já era o movimento automático de rotor central mais fino do mundo. Esqueletizar este movimento exigia uma destreza sobre-humana, pois a remoção de material de pontes e platinas já extremamente delgadas comprometeria a integridade estrutural se não fosse calculada com precisão micrométrica. O lançamento da referência BA4266 em 1985 marcou a transição do Royal Oak de um ícone puramente esportivo para um veículo de complicações e artes decorativas (Métiers d'Art). O processo envolvia serrar, limar e chanfrar (anglage) cada componente à mão, transformando o metal industrial em renda dourada. Diferente das gerações modernas que utilizam usinagem CNC avançada para o corte inicial, o modelo de 1985 carrega a alma da intervenção humana intensiva; as imperfeições microscópicas no acabamento revelam a mão do artesão, tornando cada peça ligeiramente única. A escolha do ouro amarelo (código BA) para este modelo específico reforçou o status de opulência, criando um contraste visual impressionante entre a arquitetura angular e masculina da caixa de Genta e o interior barroco e orgânico do movimento. Este modelo pavimentou o caminho para as futuras referências 'Openworked' e grandes complicações da linha Royal Oak, estabelecendo que um relógio esportivo poderia, de fato, ser um relógio de vestido (dress watch) e uma obra de arte simultaneamente. A referência BA4266 é, portanto, o elo perdido que conecta a pureza original de 1972 com a extravagância técnica das coleções contemporâneas da AP.
CURIOSIDADES
O Calibre 2120SQ utilizado neste modelo possui um sistema de rotor único onde a massa oscilante corre sobre quatro rubis em um trilho de berílio, garantindo estabilidade mesmo com a espessura mínima.
Na nomenclatura da Audemars Piguet, as letras 'BA' antes do número de referência indicam inequivocamente 'Ouro Amarelo' (Barra de Ouro), enquanto 'ST' seria aço e 'BC' ouro branco.
Devido à natureza inteiramente manual da esqueletização em 1985, a produção era extremamente limitada, com estimativas sugerindo que menos de algumas centenas foram feitos nesta configuração específica anualmente.
Este modelo não possui segundeiro (ponteiro de segundos) não por limitação técnica, mas por uma escolha estética para oferecer uma visão desobstruída do balanço pulsante e das engrenagens.
Colecionadores frequentemente apelidam estes modelos vintage de 'Lace Royal Oaks' (Royal Oaks de Renda) devido à complexidade visual do movimento que se assemelha a um tecido fino contra a pele do pulso.
A ausência de um mostrador tradicional exigia que a Audemars Piguet terminasse perfeitamente ambos os lados do movimento, pois não havia onde esconder componentes não polidos.