RESUMO
Lançado em 1993, num momento em que a indústria relojoeira ainda privilegiava diâmetros conservadores e perfis esbeltos, o Audemars Piguet Royal Oak Offshore Ref. 25721ST aterrou em Baselworld como um verdadeiro choque sísmico. Apelidado de 'The Beast' (A Besta) devido às suas dimensões então gargantuescas de 42mm e à sua arquitetura imponente, este modelo não foi desenhado para ser discreto. O seu posicionamento de mercado era audaz: visava uma nova geração de colecionadores abastados que procuravam algo mais viril e desportivo do que o Royal Oak original de 1972, sem sacrificar o acabamento de Alta Relojoaria. O Offshore representa o ponto de inflexão onde o relógio desportivo de luxo deixou de ser apenas um acessório elegante para se tornar uma declaração de robustez extrema. Com a sua junta de vedação exposta e botões revestidos a Therban (uma borracha de alta tecnologia), o 25721ST fundiu a engenharia industrial com o 'savoir-faire' suíço. A sua importância horológica é incalculável; ele é o patriarca de todos os relógios 'oversized' modernos, validando a tendência de caixas grandes que dominaria as duas décadas seguintes e estabelecendo a Audemars Piguet como uma marca capaz de se reinventar radicalmente sem perder o seu ADN.
HISTÓRIA
A génese do Royal Oak Offshore Ref. 25721ST é uma das narrativas mais fascinantes e tumultuosas da relojoaria moderna. No final da década de 1980, Stephen Urquhart, então co-CEO da Audemars Piguet, percebeu que o icónico Royal Oak — desenhado por Gérald Genta em 1972 — necessitava de uma evolução para capturar um público mais jovem e dinâmico, celebrando o 20.º aniversário do modelo. A tarefa hercúlea foi confiada a um jovem designer de 22 anos, Emmanuel Gueit. O briefing era vago, mas o objetivo era claro: masculinidade e presença.
O processo de design foi árduo e repleto de resistência interna. Gueit pegou na geometria sagrada octogonal e 'injetou-lhe esteroides'. A caixa foi expandida para 42mm — um tamanho considerado absurdo para a época, onde 36mm a 39mm eram a norma. Para acentuar a robustez, Gueit introduziu uma junta de vedação visível e maciça em borracha preta (Therban) sob a luneta, e revestiu os botões do cronógrafo e a coroa com o mesmo material, uma inovação tátil e visual. O movimento escolhido foi o Calibre 2226/2840, protegido por uma gaiola interna de ferro macio para resistência magnética, o que aumentou significativamente a espessura e o peso do relógio para uns substanciais 223 gramas.
Quando o protótipo foi finalmente apresentado em Baselworld 1993 (com um ano de atraso em relação ao aniversário de 1992), a receção foi polarizada. A lenda conta que Gérald Genta invadiu o stand da Audemars Piguet gritando que o seu Royal Oak tinha sido 'assassinado'. A crítica conservadora apelidou-o depreciativamente de 'The Beast'. Contudo, o mercado italiano, sempre na vanguarda do estilo, adotou-o rapidamente, começando com o esquiador Alberto Tomba. As primeiras 100 unidades são particularmente reverenciadas pelos colecionadores; estas peças iniciais não possuíam a gravação 'Offshore' no fundo da caixa, apenas 'Royal Oak', tornando-as o Santo Graal desta referência.
Ao longo dos anos, o 25721ST evoluiu através de várias séries (D, E, F), com subtis alterações no mostrador (do azul profundo original para cinzentos e pretos) e na construção da bracelete. O que começou como uma heresia horológica tornou-se a espinha dorsal financeira da Audemars Piguet no século XXI, gerando inúmeras iterações e edições limitadas (como as famosas 'End of Days' e 'Safari'). O Ref. 25721ST não apenas sobreviveu às críticas iniciais; ele redefiniu os parâmetros do luxo desportivo, provando que a Audemars Piguet poderia ser simultaneamente guardiã da tradição e pioneira da vanguarda excessiva.
CURIOSIDADES
O apelido 'The Beast' foi cunhado por críticos e jornalistas alemães em Baselworld 1993, chocados com o tamanho e peso do relógio.
As primeiríssimas 100 unidades (aproximadamente) são conhecidas como 'No-Offshore' ou 'Pre-Offshore', pois o fundo da caixa não tinha a palavra 'Offshore' gravada, um erro de produção que se tornou um detalhe milionário para colecionadores.
O designer original do Royal Oak, Gérald Genta, ficou furioso com o lançamento, acusando publicamente a AP de ter destruído a sua obra-prima de 1972.
O relógio pesa cerca de 223 gramas com a bracelete completa, um peso que era inédito para um relógio de luxo na época, conferindo-lhe uma sensação de 'âncora' no pulso.
Para proteger os botões e a coroa, foi utilizado Therban, um elastómero de alta performance resistente a óleos e calor, em vez de borracha comum, garantindo durabilidade a longo prazo.
O modelo foi crucial para lançar a tendência dos relógios oversized que marcas como Hublot e Panerai capitalizariam anos mais tarde.
Emmanuel Gueit, o designer, teve de lutar contra a direção técnica da AP, que inicialmente considerava impossível fabricar uma caixa daquele tamanho e complexidade com os padrões de acabamento da marca.