RESUMO
O Audemars Piguet Split-Seconds de 1949, equipado com o calibre 13’’’ VZAH, não é apenas um instrumento de cronometragem; é um artefato quase mítico na história da horologia. Posicionado no ápice absoluto do colecionismo mundial, este relógio transcende as categorias tradicionais de 'dress watch' ou 'instrumento profissional', situando-se como uma peça de museu de valor inestimável. Sua criação em 1949 representa um momento de audácia técnica singular, onde a Audemars Piguet, num período de produção extremamente limitada e austera do pós-guerra, decidiu demonstrar sua supremacia técnica fabricando um único exemplar de cronógrafo de pulso com a complexa função rattrapante (split-seconds). Este modelo é o 'Santo Graal' para puristas que valorizam a raridade absoluta e a engenharia mecânica da velha guarda. Sua filosofia de design reflete a elegância sóbria de meados do século XX, escondendo sob um mostrador clássico uma das complicações mais difíceis de executar. Ele serve como o elo perdido que conecta a era dos grandes bolsos complicados à renascença mecânica do final dos anos 90, provando que, mesmo nos seus anos mais silenciosos, a Audemars Piguet mantinha viva a chama da alta complicação.
HISTÓRIA
A história do Audemars Piguet Split-Seconds 1949 é a narrativa de uma anomalia horológica brilhante. Para compreender a magnitude deste relógio, é necessário contextualizar a posição da Audemars Piguet em meados do século XX. Ao contrário de sua produção industrializada atual, a AP era, na década de 1940, uma manufatura artesanal minúscula, produzindo menos de 1.000 relógios por ano no total. Destes, a produção de cronógrafos era infinitesimalmente pequena, estimada em pouco mais de 300 unidades entre 1930 e 1950. Neste cenário de escassez e exclusividade, surge em 1949 uma peça única: o único cronógrafo de pulso com função split-seconds produzido pela marca desde a invenção do relógio de pulso até o renascimento das grandes complicações em 1996.
O coração desta máquina é o calibre 13’’’ VZAH. Embora baseado em um ébauche da Valjoux (o lendário VZ, que também serviu de base para o Patek Philippe 1518), a versão da Audemars Piguet foi tão extensivamente modificada e refinada à mão no Vallée de Joux que se tornou uma entidade própria. A designação 'VZAH' refere-se à arquitetura específica preparada para a complicação de rattrapante. A função split-seconds, que permite cronometrar dois eventos que começam simultaneamente mas terminam em tempos diferentes, é mecanicamente mais desafiadora do que um turbilhão ou um calendário perpétuo, exigindo um ajuste microscópico das pinças de travamento sobre a roda central.
Visualmente, o modelo de 1949 encapsula a transição do Art Déco para o modernismo de meados do século. Com uma caixa de 35mm — considerada grande para os padrões da época — e asas (lugs) facetadas e pronunciadas, o relógio exalava uma presença robusta mas refinada. O mostrador equilibrava a utilidade técnica das escalas taquimétricas com a elegância dos índices aplicados em ouro.
Durante quase cinco décadas, este relógio permaneceu como um farol solitário da capacidade da AP. Enquanto a indústria mergulhava na crise do quartzo nos anos 70 e 80, o Split-Seconds de 1949 repousava em coleções privadas, desconhecido por muitos. Foi apenas nos anos 90, quando a Audemars Piguet decidiu retomar a produção de grandes complicações na linha Jules Audemars e Royal Oak, que a linhagem histórica deste modelo de 1949 foi plenamente reavaliada. Ele não teve 'gerações' ou 'evoluções' contemporâneas; ele foi um evento singular, uma 'piece unique' que definiu o padrão de excelência inatingível que a marca perseguiria meio século depois.
CURIOSIDADES
O modelo é oficialmente reconhecido como 'Piece Unique' na configuração de pulso para o período de 1949, tornando-se um dos relógios mais raros do mundo.
O movimento Valjoux VZAH utilizado neste relógio é 'irmão' técnico dos movimentos usados nos cronógrafos mais valiosos da Patek Philippe da mesma era, mas com o acabamento distinto da AP.
Foi originalmente vendido para a varejista 'Caresse' em Genebra, um detalhe confirmado pelos arquivos da Audemars Piguet.
O termo 'Rattrapante' vem do francês 'rattraper', que significa 'alcançar' ou 'recuperar', referindo-se à ação do segundo ponteiro de cronógrafo que alcança o primeiro.
Em leilões modernos de alto perfil, como os da Phillips, este modelo específico alcança cifras astronômicas, superando facilmente a marca de centenas de milhares de francos suíços devido à sua unicidade.
A ausência de produção em série deste modelo nos anos 40 deveu-se à extrema dificuldade de ajuste manual e ao custo proibitivo para a época.
A caixa de 35mm é enganosamente complexa, com asas em forma de lágrima facetadas que são extremamente difíceis de polir sem perder a definição original.