RESUMO
O lançamento do Movado Calendomatic em 1948 marcou um ponto de inflexão decisivo na história da alta relojoaria, simbolizando a transição técnica do pós-guerra onde a conveniência do movimento automático encontrou a utilidade das grandes complicações. Numa época em que a Movado era considerada uma manufatura de primeira linha, rivalizando diretamente com casas como Omega e Jaeger-LeCoultre, o Calendomatic não era apenas um instrumento de cronometragem, mas uma afirmação de sofisticação e proeza de engenharia. Posicionado no mercado como o relógio definitivo para o 'homem moderno' de meados do século — executivos, viajantes e intelectuais —, ele oferecia uma funcionalidade sem precedentes: a leitura completa do calendário (dia, data e mês) sem a necessidade de corda manual diária. O design reflete a pureza estética dos anos 40, equilibrando mostradores complexos com caixas de proporções clássicas, muitas vezes fabricadas pelos lendários ateliers da François Borgel. Para o colecionador contemporâneo, o Calendomatic é uma cápsula do tempo que captura o momento exato em que a Movado operava no auge de sua capacidade criativa e mecânica, muito antes da simplificação estética do 'Museum Dial' definir a marca.
HISTÓRIA
A história do Movado Calendomatic, introduzido no mercado em 1948, é a crônica de uma corrida tecnológica no auge da relojoaria suíça. Para compreender a importância deste modelo, deve-se olhar para o seu predecessor imediato, o 'Calendograph' de corda manual, lançado no final dos anos 30. O Calendograph foi um sucesso estrondoso, visto nos pulsos de figuras como Winston Churchill, mas a era do pós-guerra exigia mais: exigia automação. A Movado, sob a liderança técnica da família Ditesheim, respondeu a este desafio integrando o seu módulo de calendário proprietário sobre um movimento automático de 'martelo' (bumper automatic), o calibre 223.
O ano de 1948 foi crucial, pois representou a comercialização em massa desta tecnologia. Ao contrário dos rotores modernos que giram 360 graus, o movimento 'bumper' do Calendomatic oscilava para frente e para trás, criando uma sensação tátil única no pulso do usuário, uma 'batida' que os colecionadores hoje adoram. A integração do calendário triplo (dia, data, mês) num relógio automático de pulso foi uma façanha de miniaturização e complexidade.
Esteticamente, o Calendomatic evoluiu através de várias iterações de caixa. As mais cobiçadas são aquelas produzidas pela Taubert & Fils (sucessores de François Borgel), famosos por fornecerem as caixas à prova d'água para a Patek Philippe (ref. 1463) no mesmo período. Estas caixas, identificáveis pela marca 'FB' e uma chave decagonal no fundo, conferiram ao Calendomatic uma robustez rara para relógios de vestido.
Durante os anos 50, o modelo viu variações nos mostradores, incluindo versões 'two-tone' e configurações de janelas variadas (posições 12h, 3h ou 9h). No entanto, com a Crise do Quartzo nos anos 70 e a mudança de direção da marca para o design minimalista de Nathan George Horwitt, o Calendomatic foi descontinuado. Hoje, ele ressurge como um 'value proposition' extraordinário no mercado vintage, oferecendo uma complexidade mecânica e uma linhagem histórica que, em marcas como Patek ou Vacheron, custaria dezenas de vezes mais.
CURIOSIDADES
O termo 'Calendomatic' é uma junção direta de 'Calendar' e 'Automatic', uma nomenclatura futurista típica do marketing do final dos anos 40.
Os colecionadores frequentemente procuram a assinatura 'Switzerland' ou 'Fab. Suisse' no mostrador, mas as versões mais raras possuem discos de calendário em idiomas não latinos ou especificamente em português para o mercado brasileiro da época.
O movimento 'Bumper' (martelo) dentro do Calendomatic é conhecido por sua sensação física; o usuário pode literalmente sentir as molas de amortecimento rebatendo o peso oscilante, o que dá ao relógio uma 'vida' própria no pulso.
Algumas versões raras do Calendomatic foram equipadas com caixas de ouro maciço e mostradores 'Cloisonné', embora sejam extremamente escassas e alcancem valores altos em leilões.
O Calendomatic apareceu proeminentemente em anúncios da época como o relógio que 'lembra tudo por você', capitalizando na vida cada vez mais ocupada dos executivos do pós-guerra.
Diferentemente de muitos relógios modernos, a troca do mês no Calendomatic geralmente não é automática; requer ajuste manual ao final de cada mês, uma peculiaridade charmosa da mecânica da época.
Andy Warhol, um ávido colecionador de relógios, possuía várias peças da Movado desta era, apreciando a estética Art Déco que muitas vezes influenciava as garras e os numerais destes modelos.