RESUMO
O lançamento do Eterna-Matic em 1948 não representou apenas a introdução de um novo modelo, mas sim um momento de rutura tectónica na horologia mecânica. Posicionado na época como um relógio de pulso robusto e tecnicamente superior, destinado ao homem moderno do pós-guerra que exigia fiabilidade sem sacrificar a elegância, o Eterna-Matic redefiniu o que se esperava de um calibre automático. A sua filosofia de design era enganosamente simples: resolver o problema crónico de fricção e desgaste no eixo do rotor que assolava os movimentos automáticos contemporâneos. Ao integrar um sistema de rolamentos de esferas, a Eterna elevou a eficiência da corda automática a níveis inéditos, transformando uma complicação delicada num mecanismo durável para uso diário. Este relógio é fundamental na história da relojoaria não pelo seu valor estético, embora inegável com as suas linhas clássicas de meados do século, mas por ter estabelecido o projeto mecânico que se tornaria o padrão omnipresente na indústria, influenciando diretamente a arquitetura dos movimentos ETA que dominam o mercado global até aos dias de hoje.
HISTÓRIA
A história do Eterna-Matic de 1948 é, na sua essência, a história de como uma única inovação de engenharia pode alterar o curso de toda uma indústria. No final da década de 1940, os relógios automáticos enfrentavam um desafio técnico significativo: os sistemas de corda automática existentes, fossem eles de rotor completo ou de 'choque' (bumper), dependiam de um eixo central sujeito a uma tensão imensa. O peso oscilante, necessário para dar corda à mola principal, exercia uma força lateral que causava um desgaste rápido no pivô, resultando em avarias frequentes e perda de precisão. Foi neste contexto que o Dr. Rudolf Schild-Comtesse e o engenheiro-chefe da Eterna, Heinrich Stamm, apresentaram uma solução revolucionária: o acoplamento do rotor não a um eixo fixo, mas a um anel deslizante contendo cinco minúsculas esferas de aço, cada uma com apenas 0,65 mm de diâmetro.
Este desenvolvimento, patenteado e lançado comercialmente em 1948 sob o nome Eterna-Matic, reduziu drasticamente a fricção e aumentou a resistência do mecanismo a choques, permitindo que o rotor girasse livremente com a mínima inércia. O sucesso foi tão imediato e profundo que catapultou a Eterna para a vanguarda da relojoaria suíça. O modelo original apresentava uma estética sóbria e refinada, típica do pós-guerra, mas o que batia no seu interior era a vanguarda absoluta. Ao longo das décadas seguintes, a tecnologia Eterna-Matic evoluiu para equipar modelos icónicos como o KonTiki e o Centenaire. Mais importante ainda, como a Eterna era a empresa-mãe da ETA (antes desta se tornar parte do conglomerado que viria a ser o Swatch Group), esta tecnologia de rotor sobre rolamentos foi disseminada, tornando-se o arquétipo para movimentos lendários como o ETA 2824. A relevância desta invenção foi tal que, também em 1948, a marca adotou a representação estilizada das cinco esferas do rolamento como o seu logotipo oficial, um símbolo que perdura até hoje no mostrador de cada relógio Eterna, servindo como um lembrete constante de que foi este modelo específico que 'ensinou' o mundo a fabricar relógios automáticos eficientes.
CURIOSIDADES
O logotipo da Eterna, composto por cinco pontos dispostos num pentágono, representa exatamente as cinco esferas do rolamento original do Eterna-Matic de 1948.
A tecnologia de rolamentos de esferas permitiu à Eterna criar posteriormente o 'Eterna-Matic Datoptic', um dos primeiros relógios automáticos com uma janela de data ampliada.
Antes desta invenção, a Eterna produzia movimentos para outras marcas; o sucesso do Eterna-Matic solidificou a reputação da marca como uma manufatura completa e independente.
O Calibre 1199, utilizado nas versões femininas do Eterna-Matic, foi na altura o movimento automático mais pequeno do mundo a utilizar um rotor de rolamentos de esferas.
Embora famoso pela expedição Kon-Tiki de Thor Heyerdahl em 1947, a equipa usou relógios Eterna manuais; contudo, o sucesso da expedição e o lançamento do Eterna-Matic em 1948 fundiram-se no marketing da marca, levando à criação da linha 'Eterna-Matic KonTiki' anos mais tarde.
As esferas originais eram feitas de aço, mas em modelos modernos de alta horologia, a Eterna experimentou com esferas de cerâmica (Spherodrive) para reduzir ainda mais a fricção e eliminar a necessidade de lubrificação.
Colecionadores referem-se frequentemente a estes primeiros modelos simplesmente como 'Low-ball' ou 'Early bearing', valorizando exemplares que mantêm a coroa original assinada com os cinco pontos, algo raro devido à substituição em manutenções.