RESUMO
O Grand Seiko 62GS, lançado em 1967, representa um divisor de águas monumental na ilustre linhagem da manufatura japonesa, ostentando o título histórico de ser o primeiro relógio automático da marca Grand Seiko. Este modelo não foi apenas uma evolução técnica, mas uma declaração filosófica de autossuficiência e precisão. Projetado para o cavalheiro exigente e o colecionador purista, o 62GS posicionou-se no mercado como um desafiante direto à hegemonia suíça de cronometria, oferecendo uma praticidade luxuosa que dispensava a interação diária de corda manual. Sua estética é a encarnação física da confiança; a coroa, recuada e quase oculta na posição das 4 horas, sussurra ao usuário que a intervenção manual é desnecessária, graças à eficiência do sistema de carregamento 'Magic Lever'. No panteão da horologia, o 62GS é reverenciado não apenas pela sua mecânica, mas por consolidar a linguagem visual que viria a definir a identidade japonesa de luxo: superfícies planas, polimento espelhado sem distorções (o precursor do Zaratsu) e uma arquitetura de caixa sem luneta (bezel-free) que amplia a presença do mostrador. É uma peça que transcende a funcionalidade de um 'dress watch' para se tornar uma escultura cinética de importância histórica inestimável.
HISTÓRIA
A história do Grand Seiko 62GS é a crônica de uma revolução silenciosa, mas profunda, ocorrida em 1967. Até aquele momento, a Grand Seiko havia construído sua reputação impecável sobre a base de movimentos de corda manual, como o calibre 3180 do 'First' e o calibre 5722 do 'Self-Dater'. A introdução do 62GS marcou a entrada definitiva da marca na era moderna da conveniência automática, desafiando a percepção de que a precisão de cronômetro era domínio exclusivo dos calibres manuais.
O coração deste modelo, os calibres 6245A e 6246A, não surgiram do nada. Eles foram uma evolução refinada e superlativa da linha Seikomatic Chronometer de alta qualidade. A Seiko pegou uma base de movimento já robusta e precisa e a elevou aos padrões estratosféricos da Grand Seiko, ajustando-a para atender às rigorosas exigências de precisão da época. O resultado foi um movimento de baixa frequência (19.800 bph) mas de altíssima estabilidade e durabilidade.
Contudo, é no design que o 62GS cimenta seu legado. Sob a influência emergente de Taro Tanaka e sua 'Gramática do Design', o 62GS apresentou uma caixa revolucionária. A característica mais marcante é a ausência de uma luneta (bezel) tradicional. O cristal de acrílico é montado diretamente nas laterais da caixa, o que permite uma abertura de mostrador significativamente maior, conferindo ao relógio uma presença visual que desmente suas dimensões modestas de 36mm. As garras (lugs) são facetadas com ângulos agudos e superfícies espelhadas, criando um jogo de luz e sombra que se tornaria a assinatura da marca.
A decisão de colocar a coroa na posição das 4 horas e embuti-la na caixa foi uma escolha de design intencional e ousada. Em uma época em que dar corda ao relógio era um ritual matinal, o 62GS escondia sua coroa para sinalizar que o movimento do pulso do usuário era suficiente para manter a vida da máquina. Embora sua produção tenha sido relativamente curta — durando apenas cerca de dois anos antes de ser suplantada pelos movimentos Hi-Beat da série 61GS e 45GS — o 62GS deixou uma marca indelével. Ele serviu como ponte entre o classicismo dos primeiros modelos e o futurismo angular que definiria a relojoaria japonesa nos anos 70. Hoje, a reedição moderna da caixa 62GS (vista em modelos populares como o 'Shunbun' SBGA413) comprova que esta geometria, nascida em 1967, permanece atemporal e inigualável.
CURIOSIDADES
A coroa posicionada às 4 horas é tão recuada que é difícil de operar manualmente, uma escolha deliberada para enfatizar a eficiência do sistema automático 'Magic Lever'.
Devido ao seu curto período de produção (1967-1969), exemplares em perfeito estado do 62GS original são consideravelmente mais raros do que seus sucessores, os modelos 61GS e 45GS.
O design 'bezel-less' (sem luneta) torna o cristal de acrílico extremamente exposto a impactos, tornando raro encontrar modelos vintage com o cristal original intacto.
Existem variações raras com o mostrador assinado 'Diashock' abaixo do logo GS, enquanto versões posteriores omitiram essa inscrição para um visual mais limpo.
O famoso 'Medalhão do Leão' em ouro no fundo da caixa é um ponto crítico de avaliação; muitos foram polidos excessivamente ou corroídos pelo uso, afetando drasticamente o valor de colecionador.
O 62GS serviu de inspiração direta para a coleção 'Heritage' moderna da Grand Seiko, sendo a base arquitetônica para os celebrados modelos das 'Quatro Estações' (Seasons Collection).
É tecnicamente derivado do Seikomatic Chronometer, sendo o único Grand Seiko a ter suas raízes diretas em uma linha de sub-marca da Seiko antes de ser 'promovido' ao status de GS.