RESUMO
O Heuer Solunar, lançado em 1949, representa um marco seminal na horologia do século XX, transcendendo a função de simples cronometrista para se tornar uma ferramenta científica de precisão. Concebido numa época em que o lazer ao ar livre e a pesca desportiva ganhavam sofisticação, este modelo foi desenvolvido a pedido da lendária Abercrombie & Fitch para atender à crescente demanda baseada na 'Teoria Solunar' de John Alden Knight. O Solunar não é apenas um relógio; é um instrumento de navegação astronômica miniaturizado, projetado para rastrear os ciclos lunares que ditam as marés e a atividade da fauna. Posicionado no mercado vintage como uma peça de culto extremamente rara, o Solunar estabeleceu o DNA da Heuer como mestre em cronometragem desportiva técnica. A sua relevância reside na engenhosidade mecânica de adaptar um movimento para seguir um dia lunar de 24 horas, 48 minutos e 50 segundos, um feito de microengenharia que desafiou os padrões da época. Para o colecionador moderno, o Solunar é a pedra fundamental que permitiu o desenvolvimento posterior de ícones como o Mareograph e o Seafarer, simbolizando a união perfeita entre a física teórica e a alta relojoaria suíça.
HISTÓRIA
A história do Heuer Solunar começa não na Suíça, mas em Nova York, nos escritórios da Abercrombie & Fitch, em meados da década de 1940. Walter Haynes, então presidente da A&F, abordou Charles-Edouard Heuer com um desafio peculiar: os seus clientes, pescadores de elite e caçadores devotos da 'Teoria Solunar' de John Alden Knight, precisavam de um relógio que indicasse os melhores momentos para a atividade da vida selvagem, ditados pelas marés e pela lua. O problema técnico era formidável: as marés não seguem o ciclo solar de 24 horas, mas sim o ciclo lunar, que é aproximadamente 50 minutos mais longo a cada dia.
Este desafio caiu nas mãos de um jovem Jack Heuer, então com apenas 15 anos, marcando o seu primeiro envolvimento significativo nos negócios da família. Sem a expertise interna para calcular as complexas relações de engrenagens necessárias para simular o dia lunar, Jack recorreu ao seu professor de física, o Dr. Heinz Schilt. Juntos, realizaram os cálculos matemáticos precisos que permitiriam modificar um movimento Valjoux base para rastrear este ciclo alternativo.
Lançado oficialmente em 1949, o Solunar (cujo nome é uma amálgama de Solar e Lunar) apresentava um submostrador inovador às 6 horas — ou em algumas iterações, um disco central rotativo — que indicava as marés alta e baixa. O utilizador ajustava o mostrador de marés diariamente usando um botão situado na lateral da caixa, às 4 horas, alinhando-o com as tabelas de marés locais. Apesar da sua engenharia brilhante, o Solunar enfrentou dificuldades comerciais iniciais. O mercado achou a leitura complexa e a utilidade demasiado nichada para o preço premium. A produção foi limitada, estimada em apenas cerca de 1.000 unidades na sua primeira execução.
No entanto, o 'fracasso' comercial do Solunar foi o catalisador para o sucesso futuro. A Heuer percebeu que a indicação de marés precisava ser combinada com uma função mais popular: o cronógrafo. Isso levou diretamente à evolução do mecanismo para criar o 'Mareograph' (ou 'Seafarer' para a A&F) em 1950, um dos cronógrafos mais colecionáveis da história. O Solunar original de 1949 permanece, portanto, como o 'pai' de todos os relógios de regata e maré da marca, uma peça de resistência histórica que demonstra a disposição da Heuer em inovar onde outros fabricantes não ousavam pisar. Nos anos 70, o nome Solunar foi revivido numa caixa almofada com movimento automático, mas é o modelo de 1949 de corda manual que detém o verdadeiro prestígio histórico.
CURIOSIDADES
O Solunar foi o primeiro projeto 'profissional' de Jack Heuer, realizado enquanto ele ainda estava no ensino médio, solidificando o seu destino na empresa familiar antes mesmo de ingressar oficialmente.
O nome 'Solunar' deriva da teoria publicada por John Alden Knight em 1926, que postulava que a ação dos peixes e da caça era influenciada pelas posições do sol e da lua.
O movimento base Valjoux 90 era tipicamente usado para relógios com calendário completo e fases da lua; a modificação radical para rastrear apenas o ciclo de marés sem data ou mês foi uma aberração técnica na época.
Existe uma versão extremamente rara feita para a retalhista 'Gübelin', tornando-se um 'Santo Graal' para completistas da Heuer.
O botão situado às 4 horas não é um cronógrafo, mas um corretor de avanço rápido para o disco de marés, permitindo a sincronização se o relógio parasse.
Embora projetado para pescadores, o relógio ganhou o apelido de 'Relógio do Físico' internamente na Heuer devido à colaboração com o Dr. Heinz Schilt.
Devido à caixa não ser hermeticamente selada nos padrões modernos, muitos mostradores originais sofreram oxidação severa devido ao ambiente marinho, tornando exemplares com mostradores 'imaculados' astronomicamente valiosos.