RESUMO
O Breguet Classique Ref. 3130 não é apenas um relógio de vestir; é um manifesto de resistência da alta relojoaria tradicional contra a maré da Crise do Quartzo. Lançado em 1983, num momento em que a indústria suíça cambaleava, esta peça representou a cristalização da identidade moderna da Breguet sob a propriedade dos irmãos Chaumet e a direção técnica do genial mestre relojoeiro Daniel Roth. Posicionado no ápice da categoria 'dress watch' (relógio social), o 3130 foi desenhado para o colecionador erudito, aquele que valoriza a linhagem histórica acima da ostentação. Sua filosofia de design é uma tradução direta da genialidade de Abraham-Louis Breguet para o pulso, mantendo uma elegância austera mas tecnicamente complexa. Ao incorporar fases da lua, reserva de marcha e data num mostrador assimetricamente equilibrado, o 3130 estabeleceu o padrão ouro para a estética da marca, definindo os códigos visuais — mostrador guilhoché, caixa canelada e ponteiros 'pomme' — que perduram até hoje. É uma peça fundamental na horologia, pois provou que complications poéticas e acabamento manual (hand-finishing) tinham um futuro vibrante, servindo como a ponte vital entre os relógios de bolso do século XVIII e a relojoaria de pulso contemporânea.
HISTÓRIA
A história do Breguet Classique Ref. 3130 é, em essência, a história do renascimento da manufatura Breguet no século XX. No início dos anos 1970 e 80, a marca, embora lendária, havia perdido o seu brilho, produzindo relógios que pouco lembravam a genialidade de seu fundador, Abraham-Louis Breguet. A aquisição da marca pelos joalheiros parisienses, os irmãos Jacques e Pierre Chaumet, mudou este curso drasticamente. Eles contrataram o jovem e talentoso relojoeiro Daniel Roth com uma missão hercúlea: redescobrir e redefinir o que significava ser um relógio Breguet.
Roth mergulhou nos arquivos históricos e encontrou sua musa no 'Montre de Pocket No. 5', um relógio de bolso perpétuo criado por Abraham-Louis Breguet completado em 1794. O desafio de Roth, concretizado no lançamento do Ref. 3130 em 1983, foi miniaturizar a arquitetura e a estética deste relógio de bolso para uma caixa de pulso de 36mm, sem sacrificar a legibilidade ou a elegância. O resultado foi uma obra-prima de proporção e equilíbrio. Diferente da maioria dos relógios da época que buscavam a simetria perfeita, o 3130 abraçou a complexidade assimétrica do No. 5, posicionando a fase da lua no canto superior direito e a reserva de marcha no esquerdo, ancorados por um mostrador de data na parte inferior.
Tecnicamente, o relógio era igualmente impressionante para a época. Roth utilizou o Calibre Frédéric Piguet 71 como base — um dos movimentos automáticos mais finos já produzidos — e desenvolveu o módulo de complicações sobre ele, resultando no Calibre 502 (frequentemente referido como 502.DR em homenagem a Roth). A construção do movimento exigia um rotor descentralizado para manter o perfil esbelto, uma característica técnica que se tornou sinônimo da linha Classique.
Ao longo das décadas, o 3130 manteve-se notavelmente fiel ao design original de 1983. As primeiras gerações são identificáveis pelos fundos de caixa sólidos (snap-back), enquanto o seu sucessor direto e variante, o Ref. 3137, introduziu um fundo de safira para exibir o movimento magnificamente decorado. O 3130 consolidou o uso do guilhoché manual não apenas como decoração, mas como uma ferramenta funcional para delimitar diferentes zonas de leitura no mostrador, uma técnica que a Breguet moderna continua a empregar religiosamente. A importância deste modelo não pode ser subestimada; ele provou que havia um apetite voraz por relojoaria mecânica tradicional de altíssimo nível em plena era do quartzo, pavimentando o caminho para o boom da relojoaria de luxo dos anos 90 e 2000. O Ref. 3130 permanece como o 'Breguet definitivo' para muitos puristas, representando o momento exato em que o espírito de 1775 foi trazido com sucesso para a era moderna.
CURIOSIDADES
O Calibre 502.DR utilizado neste relógio possui um rotor descentralizado incomum, necessário para manter a espessura do movimento abaixo de 2.4mm sem sacrificar a capacidade de corda automática.
Daniel Roth, o arquiteto por trás deste modelo, eventualmente deixou a Breguet para fundar sua própria marca independente, mas o 3130 é frequentemente citado como sua maior contribuição para a relojoaria corporativa.
O mostrador do 3130 não é estampado; é um disco de ouro maciço prateado, trabalhado à mão em tornos 'rose engine' centenários, onde cada padrão (Clous de Paris, Vieux Panier) serve para reduzir o reflexo e aumentar a legibilidade.
O modelo original em que se baseia, o Relógio de Bolso No. 5, foi um dos poucos relógios 'perpétuos' (automáticos) feitos pelo próprio Abraham-Louis Breguet e foi vendido originalmente para o Conde Journiac-Saint-Méard.
Este modelo apresenta a famosa 'Assinatura Secreta' da Breguet, gravada levemente no mostrador (geralmente visível apenas sob luz rasante ao redor do numeral XII), uma medida anti-falsificação criada em 1795 e revivida por Roth.
Embora o modelo 3130 tenha sido descontinuado para dar lugar ao 3137 e posteriormente ao 7137 (que aumentou o tamanho da caixa para 39mm), o tamanho original de 36mm do 3130 é hoje o mais cobiçado por colecionadores que buscam proporções clássicas.
As caixas do 3130, com suas laterais caneladas a frio, têm as alças soldadas à caixa individualmente e finalizadas à mão, uma técnica de construção extremamente trabalhosa e rara na produção em série.